#01 – Câmara Municipal da Maia Paços do Concelho

Da cidade
Premonição dos
primeiros passos do
concelho

Muito depois da transferência da sede de concelho do Castêlo da Maia para o lugar de Barreiros (1902), no exercício do primeiro mandato do Doutor José Vieira de Carvalho, no quadriénio de 1970 a 1974, ainda a Revolução de Abril não sucedera, a Maia era ainda profundamente rural, mesmo nas imediações do cruzamento da estrada Porto-Braga com a EN 107.

Começa a notar-se, porém, uma aceleração dos processos de urbanização e densificação nas imediações do cruzamento e do pequeno centro administrativo, já com algum comércio e serviços, alimentada pelo crescimento das indústrias que antes se tinham fixado nos arrabaldes do Porto, ao longo das linhas de água ou nas margens da Via Norte, aberta desde 1959, pelo êxodo do centro do Porto para a periferia e pela fixação da população recém-chegada das colónias.

Contornando as exigências centralistas que de Lisboa chegavam por ofício, o projeto dos Paços do Concelho rompe com as formas preexistentes, institui uma nova ordem espacial na então vila da Maia, mais abstrata. A implantação do edifício, à ilharga da antiga estrada Porto-Braga, com fachada principal bem exposta a sul, explora a tensão do cruzamento viário. A arquitetura dá resposta a novas necessidades organizacionais e por isso se faz. A obra é concluída em 1982, já no segundo primeiro mandato de Vieira de Carvalho.

De forma premonitória, o projeto desenha um amplo espaço público frontal dos Paços do Concelho, configurando uma visão não construída de uma praça, um pequeno rossio, com pavimentação inspirada nos padrões de Burle Marx, muito longe da calçada de Copacabana, para marcar o centro. Na cidade, como no Universo, quase nada se cria, tudo se transforma, e sendo provável que Souto de Moura, 30 anos depois, não tenha conhecido a premonição de António Machado, o certo é que a praça aconteceria. No início da década de 80, o automóvel sairia vencedor, com a configuração viária dos ajardinamentos envolventes. Mas o centro já tinha começado a existir; depois da arquitetura do edifício viria, com o tempo, o resto.

Da arquitetura
Desenhar a
representação do
novo poder autárquico

O edifício dos Paços do Concelho é, ele próprio, o “hipocentro” da Maia. Implantado no lado norte da Praça do Doutor José Vieira de Carvalho, em conjunto com a Torre Lidador, define-se como construção de exceção no centro urbano. 

O projeto, desenvolvido nos primeiros anos da década de 70 do século passado, mostra-nos a intencionalidade do arquiteto em desenhar a representação do novo poder autárquico. A palavra “novo” significa, aqui, uma espécie de (re)celebração do poder local através da forma da arquitetura e, também, através da forma da cidade. Pois a decisão de construir de raiz outra sede do poder autárquico, para além de motivos funcionais / programáticos (inerentes à concentração de uma série de serviços camarários), certamente também se deveu à necessidade de (re)afirmar o centro enquanto rosto da câmara municipal maiata.

Com o novo edifício clarificou-se o grande vazio a sul, definindo-se com maior rigor a praça, e, simultaneamente, procurou-se, através da arquitetura de gosto brutalista, representar as qualidades do que idealmente poderá ser a representação física ideal do poder autárquico: segurança, firmeza e estabilidade.

O projeto mostra-nos uma proposta algo diversa da solução construída, sobretudo, pelo invólucro da construção combinar as materialidades da cerâmica e do granito numa composição construtivo-representacional dos volumes: a cerâmica como revestimento de elementos verticais cegos do volume principal (como as empenas) e o pseudo-torreão junto à entrada principal; o granito como revestimento da generalidade dos elementos da composição, nomeadamente, no volume principal, nas zonas parietais moduladas e modeladas pelos vãos, no grande entablamento que o remata superiormente, e no volume do salão nobre. A composição parece querer emprestar às formas construídas alguma leveza pela tessitura das superfícies em cerâmica, perante o peso dos elementos em granito. Apesar de tudo, a forma construída recusou o uso da cerâmica em favor do revestimento total em granito.

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